Ex-presidente tem 60 dias para pagar ou enfrentar arresto de bens, incluindo pensão presidencial.
Pretória/Maputo - O Tribunal Superior de Gauteng, em Pretória, ordenou esta quarta-feira, 22 de outubro, que o ex-presidente sul-africano Jacob Zuma devolva cerca de 29 milhões de rands (aproximadamente 1,6 milhões de dólares ou 109 milhões de meticais) gastos ilicitamente pelo Estado em processos judiciais privados ao longo de anos.
60 Dias Para Pagar ou Perder Bens
A decisão do juiz Anthony Millar é categórica: Zuma tem 60 dias para devolver o montante total de 28.960.774,34 rands, acrescido de juros calculados desde 25 de janeiro de 2024 até à data do pagamento efetivo.
Em caso de incumprimento, o Tribunal autorizou o Procurador do Estado a:
- Emitir mandado de execução judicial
- Arrestar e vender bens móveis e imóveis de Zuma
- Confiscar parte ou totalidade da pensão presidencial (sujeito a ordem judicial adicional)
- Congelar ativos financeiros
Origem da Dívida: Caso do Tráfico de Armas
O montante de 29 milhões de rands corresponde aos custos legais que o Estado sul-africano suportou durante décadas para defender Jacob Zuma no controverso caso do tráfico de armas dos anos 1990 (Arms Deal).
O Tribunal de Pretória considerou que a defesa legal de Zuma no caso da compra de armas era um assunto pessoal, não de interesse público, e que o uso de fundos públicos para custear defesa privada violou princípios de responsabilidade e transparência nos gastos governamentais.
"Litigou em Escala Luxuosa"
Durante os argumentos judiciais, o advogado George Avvakoumides, representando a Presidência e o Procurador do Estado, afirmou que Zuma litigou "em escala luxuosa" usando fundos públicos.
"Embora a Presidência não seja insensível à posição de Zuma, o Estado de direito deve prevalecer", argumentou Avvakoumides, acrescentando que tanto o Tribunal Superior quanto o Supremo Tribunal já haviam deixado claro que Zuma deveria reembolsar o dinheiro.
Defesa de Zuma Questiona Decisão
O advogado de Zuma, Thabani Masuku, contestou a decisão durante as audiências, questionando por que apenas o ex-presidente deveria arcar com o pagamento enquanto os funcionários estatais que autorizaram os pagamentos não foram responsabilizados.
Masuku denunciou a decisão como "ilegal" e argumentou que seu cliente não tem meios financeiros necessários para quitar a dívida.
Preocupação do Juiz Com a Idade
Durante a audiência, o juiz Millar demonstrou alguma preocupação com as implicações da decisão, questionando:
"O senhor Zuma está nos seus 80 anos. É apropriado para o tribunal emitir tal ordem? Todos têm direito a viver e não devem ser levados à pobreza", observou o magistrado.
Apesar das reservas, o juiz manteve a decisão, mas condicionou qualquer arresto da pensão presidencial a uma ordem judicial adicional.
Vitória Para a Oposição
A Aliança Democrática (DA), partido de oposição que se juntou à ação judicial, celebrou a decisão como uma vitória para os contribuintes sul-africanos e para o Estado de direito.
"Em todos os sentidos possíveis, a DA continua a lutar pelo Estado de direito, proteção do dinheiro dos contribuintes e erradicação da Captura do Estado", declarou o porta-voz nacional Willie Aucamp.
O partido insistiu que juros fossem adicionados ao valor e defendeu o arresto da pensão de Zuma caso ele não pague a dívida.
Relatórios Trimestrais Obrigatórios
O Tribunal ordenou ainda que o Procurador do Estado apresente relatórios trimestrais sob juramento sobre:
- Passos dados para recuperar o dinheiro
- Medidas que pretende implementar
- Progressos na cobrança da dívida
Os relatórios devem ser apresentados ao tribunal a cada três meses até que a dívida seja totalmente quitada.
Zuma Reunir-se-á Com Advogados
Numa conferência de imprensa em Durban, na quinta-feira seguinte à decisão, Zuma afirmou que estava fora do país quando o assunto foi discutido e que se reunirá com seus advogados para decidir os próximos passos.
"Quando o assunto foi discutido, eu não estava lá, estava no exterior. Vou reunir-me com meus advogados para decidir como proceder, então não posso comentar porque não estava presente. Fizemos um acordo para nos reunir e decidir como avançar", declarou o líder do partido uMkhonto weSizwe (MK Party).
Contexto: Histórico Legal de Zuma
Jacob Zuma, que governou a África do Sul de 2009 a 2018, enfrentou múltiplas acusações de corrupção relacionadas ao negócio de armamentos de 1999, que envolveu a compra de equipamento militar no valor de milhares de milhões de dólares.
Principais Episódios
- 1999: Início do escândalo do tráfico de armas
- 2005: Acusações formais contra Zuma
- 2009-2018: Presidência de Zuma
- 2018: Renúncia sob pressão do ANC
- 2021: Prisão por desacato ao tribunal (7 dias)
- 2024: Supremo Tribunal confirma que Zuma deve reembolsar Estado
- Outubro 2025: Ordem de pagamento em 60 dias
Motins de 2021
Quando Zuma foi preso em 2021 por desacato ao tribunal, eclodiram motins violentos que mataram centenas de pessoas e causaram milhares de milhões em danos. Sua filha Duduzile alimentou os distúrbios nas redes sociais, e a inacção de Zuma foi vista como aprovação tácita da violência.
Custos Para a África do Sul
Os 29 milhões de rands são apenas uma fração do que este caso custou à África do Sul, segundo analistas políticos. Os danos à reputação internacional do país e os custos indiretos do escândalo são incalculáveis.
Possível Recurso
Embora Zuma tenha indicado que consultará seus advogados, especialistas jurídicos consideram improvável que um recurso seja bem-sucedido, dado que o Supremo Tribunal de Apelação já confirmou em 2024 que o ex-presidente não tinha direito a apoio legal financiado pelos contribuintes.
Questões Fiscais Pendentes
Além da ordem de pagamento, há especulações sobre se a Receita Sul-Africana (SARS) poderá cobrar impostos sobre os benefícios que Zuma acabou recebendo através do financiamento estatal de seus honorários legais privados.
Reações Políticas
Partido ANC
O partido no poder, African National Congress (ANC), do qual Zuma foi membro durante décadas antes de fundar o MK Party, manteve-se em silêncio sobre a decisão judicial.
Sociedade Civil
Organizações da sociedade civil aplaudiram a decisão, vendo-a como um passo importante na luta contra a impunidade e corrupção na África do Sul.
Analistas
Comentadores políticos consideram a decisão um marco no combate à chamada "State Capture" (Captura do Estado) que caracterizou o governo Zuma.
Impacto no MK Party
A decisão surge num momento delicado para o uMkhonto weSizwe Party (MK Party), fundado por Zuma, que tem procurado estabelecer-se como força política relevante na África do Sul pós-apartheid.
A dívida de 29 milhões de rands pode afetar a imagem do partido e a capacidade de Zuma de se apresentar como alternativa política credível.
Precedente Jurídico
A decisão estabelece um precedente importante na África do Sul: líderes políticos não podem usar fundos públicos para custear defesas legais em casos pessoais, mesmo quando ainda estão no poder.
Próximos Passos
Nas próximas semanas, espera-se que:
- Zuma se reúna com seus advogados para avaliar opções
- Possível anúncio de recurso ou estratégia de pagamento
- Procurador do Estado prepare mecanismos de execução
- Primeiro relatório trimestral sobre recuperação da dívida
Transparência e Accountability
Para muitos sul-africanos, a decisão representa uma vitória da transparência e da responsabilização (accountability) sobre décadas de corrupção e impunidade.
"Ninguém está acima da lei", resumiu Willie Aucamp da DA, ecoando o sentimento de milhões de contribuintes que viram seus impostos serem usados para defender um ex-presidente em casos criminais pessoais.
Conclusão
A ordem judicial contra Jacob Zuma marca mais um capítulo na longa saga legal do ex-presidente sul-africano e envia uma mensagem clara: o uso indevido de fundos públicos terá consequências, independentemente da posição política do infrator.
Agora, resta saber se Zuma conseguirá reunir os 29 milhões de rands em 60 dias ou se verá seus bens arrestados e sua pensão confiscada para quitar a dívida com o povo sul-africano.
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Categoria: INTERNACIONAL | África do Sul Data: 25 de Outubro de 2025
Contexto Regional: A decisão judicial na África do Sul é acompanhada de perto em Moçambique e outros países da SADC como exemplo de luta contra corrupção e impunidade de líderes políticos.
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